O papel dos festivais no Brasil

O papel dos festivais no Brasil

Por Antonio Leal e Tetê Mattos*

O circuito de festivais brasileiros transformou-se, ao longo dos últimos 10 anos, numa extraordinária plataforma de circulação, exibição, reflexão e formação de público para o cinema nacional. Tanto os festivais brasileiros que acontecem no país, quanto aqueles que ocorrem no exterior, são uma vitrine natural, eficiente e permanente para a difusão do
produto audiovisual brasileiro: filmes de curta, média e longa metragens, documentários ou ficção, animação, vídeos digitais, mídia móveis, internet e outros suportes.

Estudos demonstram que, onde acontece festival, além da exibição, há também formação, reflexão, promoção, intercâmbio cultural, diversidade, articulações política e setorial, reconhecimento artístico, ações de caráter social, geração de emprego e renda, além de um crescente ambiente de negócios. O entorno do festival propicia o plantio de uma semente capaz de promover o surgimento e o fortalecimento de uma série de iniciativas que resultarão na difusão, preservação e resgate do acervo audiovisual brasileiro, na formação de plateias, na criação de uma cidadania audiovisual, no surgimento de novos talentos e na
valorização dos profissionais que atuam no setor.

Esse é um circuito que cresce a uma taxa de quase 20% ao ano. Apesar da crise econômica mundial, que provocou a redução de investimentos na área cultural, fechou-se o ano de 2009 com cerca de 190 eventos audiovisuais realizados. É um número que confirma o índice histórico de crescimento anual do circuito.

O Fórum dos Festivais acompanha essa evolução e busca atuar na constante integração desse conjunto altamente diversificado e heterogêneo de festivais. Além disso, exige o cumprimento do Código de Ética da entidade, que é a garantia para os realizadores da qualificação do evento. Atualmente o Fórum conta com 60 festivais associados.

Nesse contexto, em parceria com a Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura, o Fórum dos Festivais realizou o primeiro estudo setorial de festivais no país: o Diagnóstico Setorial 2007 / Indicadores 2006. Essa iniciativa refletiu a necessidade de prospectar, analisar e consolidar as principais informações desse setor estratégico para o audiovisual brasileiro, produzindo um estudo setorial referencial, fazendo surgir uma base informativa inédita em condições de contribuir para a construção de políticas públicas e nortear os apoios da iniciativa privada ao circuito de festivais. Tratou-se de organizar e disponibilizar uma plataforma consultiva em condições de orientar as relações de todos os segmentos
interessados na esfera de atuação dos festivais audiovisuais.

Esse estudo inédito, realizado em 2007 e lançado em 2008, apresenta dados relativos a 132 eventos, número total de festivais que a pesquisa alcançou e que constitui a base das análises realizadas. Por meio dessa pesquisa foi possível conhecer com mais profundidade o setor de festivais audiovisuais que revelou extraordinária vitalidade tanto nos aspectos artístico-culturais, quanto econômicos e sociais.

O conjunto de informações sistematizadas na pesquisa sobre o setor festivais audiovisuais envolveu os seguintes aspectos: a função dos festivais, perfis dos eventos, impactos econômico, social e cultural, volume de recursos movimentados pelo setor, geração de emprego, quantidade de exibições, distribuição regional do circuito de festivais, quantidade de espectadores, entre outros.

A pesquisa considerou como “evento audiovisual” toda iniciativa estruturada em mostras ou sessões capaz de promover o produto audiovisual, respeitando-o como manifestação artística e disponibilizando-o à sociedade, com proposta de periodicidade regular. Não foram consideradas pela pesquisa as chamadas iniciativas eventuais de exibição.

A metodologia adotada

O Diagnóstico Setorial 2007/ Indicadores 2006 atuou com uma cobertura nacional e internacional do circuito de festivais audiovisuais brasileiros, objetivando a captura de uma ampla gama de dados sobre essa atividade. A definição metodológica aplicada foi estabelecida em três premissas: ineditismo, potencial do setor e amplo raio de cobertura das questões.

Tratando-se de um estudo inédito, houve uma necessidade prioritária da criação de uma estrutura de informações primárias que demandou um longo período de atividades, mas que se encontra pronta para prosseguir nos futuros levantamentos de indicadores do setor de festivais.

Em uma primeira etapa foram definidos os objetivos da pesquisa e seus possíveis desdobramentos.

Objetivos – Plano de pesquisa:

– compreender a configuração do setor dos festivais de cinema brasileiros realizados no Brasil e no exterior;

– identificar os diferentes perfis do setor;

– diagnosticar o potencial cultural, econômico e social desse setor;

– identificar aspectos relacionados às ações dos festivais;

– criar base de dados para subsidiar ações da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura;

– identificar as expectativas, sentimentos, opiniões e dificuldades encontradas pelos organizadores dos festivais audiovisuais.

Procuramos avaliar o número de festivais que participariam do diagnóstico para termos uma real dimensão do universo pesquisado. Nesse momento, definimos o método de coleta de dados e os instrumentos utilizados na pesquisa.

A base preliminar utilizada para a identificação dos eventos participantes da pesquisa foi o site do Fórum dos Festivais e o Guia Brasileiro de Festivais de Cinema e Vídeo (Associação Cultural KinoForum), que se revelaram ferramentas absolutamente  fundamentais para este trabalho. O primeiro por ter se transformado num ponto de referência, aglutinador da atividade e por receber constantemente informações dos festivais.

O segundo por ser uma referência histórica para o setor de festivais, e pioneiro na divulgação de dados dos eventos audiovisuais, suprir carências e manter uma impecável regularidade nas suas edições desde 1999.

Já na segunda etapa, trabalhou-se na elaboração do questionário a ser aplicado aos organizadores de festivais. Contamos com a consultoria da pesquisadora Margareth Luz, socióloga com vasta experiência na área cultural. Grande parte do valor da pesquisa dependeria da eficácia do questionário. Para isso, fizemos um “teste– piloto” para nos certificarmos da qualidade das perguntas por nós formuladas.

A conceituação aplicada ao questionário-padrão da pesquisa visou a dar condições de apuração da amplitude da atuação do setor de festivais buscando cobrir, em grande parte, as variadas ações dos eventos e suas ramificações na sociedade.

Na terceira etapa contamos com o apoio da FEC (Fundação Euclides da Cunha para Apoio Institucional à Universidade Federal Fluminense), que desenvolveu um projeto de elaboração do questionário on-line distribuído para todos os festivais.

A quarta etapa constitui-se do levantamento dos dados. A coleta das informações foi a etapa que apresentou maior dificuldade pelo retorno descontinuado do questionário-padrão, com impacto nos cronogramas predefinidos e demandando esforço redobrado da equipe responsável por essa tarefa.

O desafio da pesquisa foi lidar com a ausência de bancos de dados e a informalidade
de alguns festivais. Essas dificuldades foram superadas com o exaustivo trabalho da equipe de produção, na cobrança das respostas, algumas vezes feitas por telefonemas.

Na quinta etapa, iniciamos o trabalho minucioso de tabulação das respostas para, a partir daí, dar início a análise dos resultados, o principal instrumento de reflexão para o setor.

*Trecho do artigo de Antonio Leal e Tetê Mattos no livro “Cinema e Mercado”, volume III da coleção “Indústria Cinematográfica e Audiovisual Brasileira”, uma coedição do Instituto Iniciativa Cultural e Escrituras Editora.

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Foto: Exibição de filme durante a Mostra CineBH 2010. Crédito: Netun Lima