TV Brasileira: dos anos 1950 aos 2000

TV Brasileira: dos anos 1950 aos 2000

 

Por Edgard Ribeiro do Amorim

A influência da teIevisão na indústria cultural brasileira e no comportamento social é indiscutível. Sua veiculação alterou valores e impôs costumes, formando, mesmo dentro dos desníveis sócio-econômicos, uma população totalmente envolvida por suas informações. Mostrar a trajetória histórica da televisão, desde a década de 50 até a atualidade, é a proposta desta publicação.

Década de 50

Como já tem sido escrito em diversas pesquisas históricas, a televisão brasileira, na década de 50, teve um caráter de aventura, com o pioneirismo de seus profissionais desbravando os mistérios do novo veículo. Inaugurada em 18 de setembro de 1950, em São Paulo, com a TV Tupi Canal 3, a televisão transmitiu, desde o início, uma programação diversificada.

Os primeiros anos foram marcados pela fase de aprendizagem, tanto para os responsáveis pela parte técnica, que adquiriam maior formação profissional na prática, como para os da parte artística, que se expressavam dentro dos conhecimentos adquiridos no rádio, no cinema e no teatro. Os recursos técnicos eram poucos, com um equipamento mínimo para manter uma estação no ar. Mesmo assim, o veículo ia se expandindo e fazendo sua conquista pelo país.

Em janeiro de 1951, inaugurava-se a TV Tupi Canal 6, no Rio de Janeiro; em março de 1952, inaugurava-se a TV Paulista Canal 5, em São Paulo, e em setembro de 1953, a TV Record Canal 7, também em São Paulo.

Embora ainda longe de ter encontrado uma linguagem televisiva, São Paulo, nessa época, era considerado o melhor centro produtor. Com pouco horário de permanência no ar, em geral das 18 às 22 horas, a programação exibia diferentes gêneros, todos encarados com extrema seriedade de realização.

Um deles, o teleteatro, foi o mais significativo laboratório do surgimento de uma linguagem dramática televisiva. Importantes obras nacionais e estrangeiras eram exibidas, com excelentes níveis de adaptação e interpretação.

A encenação continha-se dentro das possibilidades técnicas e do pequeno valor econômico destinado às produções, o que fazia com que a criatividade dos profissionais envolvidos se evidenciasse ao máximo. Os cenários eram mais inventivos que ricos, e os figurinos eram trazidos pelos próprios atores, que adaptavam ou alugavam roupas para suas encenações.

O telejornalismo, gênero sempre muito produzido, era mais lido que ilustrado, e as notícias eram, em grande parte, obtidas dos jornais impressos, já que os noticiários televisivos só eram exibidos à noite. Com o desenvolvimento econômico e artístico das emissoras, matérias próprias locais começaram a ser produzidas. Quando havia uma reportagem de interesse fora da cidade, o jornalista tinha que pagar a própria passagem ou conseguir patrocínio para realizá-la.

A telenovela, apesar de constante no ar desde 1951, não tinha a duração nem a importância popular das atuais. Quase sempre eram adaptações da literatura brasileira ou internacional. Muito prestigiadas foram as telenovelas infanto-juvenis, com bom nível de encenação e intenções educativas. Eram levadas ao ar uma ou duas vezes por semana.

Havia também o seriado infanto-juvenil, com aventuras vividas por heróis como Capitão Sete, O Falcão Negro, os de ficção científica como Lever no Espaço, entre outros, e os seriados românticos, cujo exemplo mais expressivo foi Alô Doçura, da TV Tupi.

O musical, gênero muito utilizado nessa época, era produzido desde as mais simples cópias de programas radiofônicos até pretensiosas superproduções no estilo dos musicais cinematográficos norte-americanos, guardadas as devidas proporções financeiras.

Havia, também, importantes programas de música erudita. O humor era feito através de quadros ou pequenas histórias, utilizando, quando possível, a presença de auditório.

Havia programas de circo, transpostos para o estúdio exatamente como se apresentavam no picadeiro. Havia ainda quadros de humor nos programas infantis. Os programas de entrevistas ou debates tinham esquemas mais Iivres, e a duração era quase que estabelecida pelo interesse despertado pelo assunto, visto que eram emitidos como última atração da emissora.

Como eram ao vivo, o tema era comentado não só entre os participantes convidados, mas entre os telespectadores, que telefonavam à emissora, intervindo com perguntas e opiniões. Essa interação emissora-telespectador ao vivo se perdeu quando os programas passaram a ser gravados em videoteipe e só foi recuperada nos anos 90.

O intervalo comercial, além de veicular a publicidade, tinha a oportuna característica de socorrer erros da programação sempre que um problema técnico acontecesse ao vivo ou um estúdio ainda não estivesse pronto para a próxima atração. Havia a famosa garota-propaganda, que, com seu charme, elegância ou beleza, atraíam maior audiência quando exibiam os produtos.

Entre erros e acertos, os conhecimentos televisivos foram se aprimorando, e o horário de permanência diária da estação no ar, aumentando. Em meados da década de 50, o veículo iniciou sua imposição como meio de comunicação. O número de emissoras cresceu no Rio de Janeiro.

Outras cidades, como Belo Horizonte, Curitiba, e, mais tarde, Porto Alegre, inauguraram suas estações de TV. O processo de nacionalização da construção dos aparelhos se acelerou, importando-se, cada vez menor número de peças para compor o televisor. Esse fato propiciou seu barateamento e intensificou as vendas. Em 1956, calculava-se que existiam 260 mil aparelhos com, aproximadamente, um milhão e meio de telespectadores em todo o país.

O IBOPE – Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística, criado em 1954, realizava pesquisas, estimulando gêneros de programação e incentivando a publicidade a se comunicar mais intensivamente nos horários de melhor audiência.

Em 1956, pela primeira vez em São Paulo, as três emissoras de TV reunidas arrecadaram mais dinheiro publicitário que as treze emissoras de rádio paulistas juntas. Deixavam, assim, as rádios, de ser o principal sustentáculo financeiro da televisão, visto que as três emissoras de TV, em São Paulo, pertenciam a grandes grupos radiofônicos que, até então, as amparavam.

Nos primeiros anos da televisão, as programações das emissoras eram voltadas basicamente à área de alcance de suas transmissões, o que Ihes conferia um caráter nitidamente local. As transmissões externas (in loco) eram as esportivas, com equipamentos rudimentares, imagem de má qualidade e muitos problemas técnicos acontecendo no ar. Entretanto, foi através do esporte que o veículo não só começou a conquistar um público mais popular, mas também arrojou-se a uma importante aventura: a transmissão a longa distância.

A primeira realização coube à TV Record de São Paulo, em 1956, que transmitiu, da cidade de Campinas (SP) para a cidade de São Paulo, um jogo futebolístico. Para rivalizar com as outras emissoras, a Record lançou o slogan “100 quilômetros à frente”. O passo estava dado. Daí em diante, diversas outras transmissões a distância foram realizadas, inclusive pela mesma TV Record, que fez a primeira transmissão interestadual, exibindo o grande prêmio do Jóquei Clube do Rio de Janeiro para o público paulista. Nesse evento, em reportagem na praia de Copacabana, as pessoas entrevistadas não acreditavam que estivessem sendo vistas em São Paulo.

As transmissões eram feitas através da colocação estratégica de muitos retransmissores de ondas entre as cidades envolvidas. Com o tempo, intensificaram-se as transmissões sistemáticas (diárias) para cidades próximas, como Santos (SP). Aos poucos, perdia a televisão a idéia de regionalização.

A idéia de formação de redes, no entanto, estava longe de ser cogitada. Em termos de conquistas técnicas do veículo, melhores equipamentos foram sendo adquiridos pelas emissoras. Em 1957, foi feita a primeira experiência de videoteipe (gravação de som e imagem em fita magnética) na TV Rio Canal 13, no Rio de Janeiro, num programa de Chico Anísio, no qual o comediante dialogava consigo mesmo. Talvez pelo alto custo do equipamento ou pela desinformação da idéia de sua utilização na industrialização da televisão, a experiência não teve continuidade.

Ante as novas conquistas de mercado e já impressionadas com a força de comunicação da televisão, as agências publicitárias começaram a pesquisar os hábitos de consumo do telespectador e saber que produtos seriam melhor veiculados, trazendo melhores lucros. Acelerava-se, então, o fator que viria a se impor como uma das maiores forças desse meio de comunicação — a publicidade.

Desde o começo, a televisão utilizou filmes, de curta ou longa duração, chegando a produzir pequenos números musicais cinematográficos para serem exibidos. A partir de 1958, surgiu no vídeo, principalmente no eixo Rio–São Paulo, a veiculação de séries cinematográficas importadas dos Estados Unidos.

Ante um custo mais barato de programação em relação à telenovela e ao teleteatro, a iniciativa trouxe vantagens para as emissoras, e logo se tornou uma das preferências do público. Causou muitas polêmicas, porém, no meio artístico, por diminuir o espaço de atuação dos profissionais brasileiros de televisão.

Pelo final da década de 50, a programação já alcançava quase o dia todo, do meio-dia até os longos teleteatros ou entrevistas políticas que se estendiam madrugada adentro.

Vivendo a euforia industrial brasileira impulsionada pelo então presidente Juscelino Kubitschek, a indústria eletrônica desenvolveu esforços para construir aparelhos receptores de TV totalmente brasileiros, que podiam ser comprados pela nova modalidade de crediários que estavam se popularizando no mercado econômico interno do país. Assim, a televisão começou a conquistar novo público entre as camadas da população de menor poder aquisitivo.

Em 1959, contava já o Brasil com doze emissoras em pleno funcionamento. Em conseqüência à sua expansão, a televisão foi popularizando seus temas. Apenas o teleteatro, com cada vez melhor qualidade de encenação, mantinha-se acima do nível intelectual médio do novo público conquistado. Os programas de humor e musical se intensificaram, bem como as transmissões esportivas.

Ante a grande penetração em todas as camadas da população, o Ministério da Justiça promulgou a primeira legislação regulamentando a censura de televisão no Brasil.

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Foto: Programa Musical – TV Record-1955. Arquivo Multimeios. CCSP.